27.6.03

É interessante o caminho que a Marvel vem tomando no cinema. As escolhas de diretores para seus principais filmes tem sido até o momento, muito feliz. Porque são todos diretores fortes e com personalidade, que imprimem uma identidade aos filmes semelhante à identidade que os grandes roteiristas imprimiam às fases em que escreviam um determinado título. Sam Raimi deu ao Homem-Aranha aquele clima de quadrinho clássico, colorido, leve, engraçado. Bryan Singer deu aos X-Men um tom sóbrio e realista, condizente com o teor psicológico dos personagens. E Ang Lee... bem, Ang Lee fez o seu próprio Hulk.

De fato, a primeira coisa que me passou pela cabeça ao sair do cinema, é que o título do filme era uma injustiça. Ele deveria ter se chamado Ang Lee's Hulk. Porque esse filme é como aquelas Graphic Novels que saem de tempos em tempos, onde algum roteirista consagrado, com um estilo próprio facilmente reconhecível, como Frank Miller, John Byrne ou Alan Moore por exemplo, reformula algum super-herói clássico em uma história fechada. O Hulk do cinema é o Hulk de Ang Lee. Um Hulk inédito e maravilhoso.

Mas não sejam ingênuos a ponto de imaginar que Hulk luta com espadas chinesas ou caminha sobre bambus. Associar imediatamente Lee com "O Tigre e o Dragão" é um grande, enorme erro. Seu envolvimento com o personagem nesse filme foi intenso e completo. De fato, até mesmo a captura de movimento do Hulk digital foi feita do próprio Ang Lee, porque ele simplesmente não conseguia explicar em palavras para um ator como ele imaginava a criatura se movendo. Ele mergulhou fundo na história do dr. Bruce Banner, e mesclou a ela sua própria identidade. Como resultado, um filme nada menos do que genial.

A direção e edição do filme, logo de cara, já se mostram diferentes de toda e qualquer outra obra que você jamais viu. É algo tão diferente e novo, que é como aquelas obras geniais em que somente depois de superada a estranheza e o choque do desconhecido é que se vai compreender a fundo a grandiosidade. Ang Lee faz questão de lembrar a todos o tempo todo que estão assistindo a uma história em quadrinhos. Os enquadramentos, as fontes das letras, a divisão da tela, as mudanças rápidas de tomada. E ao mesmo tempo, o ritmo do filme, o roteiro, são todos inexplicavelmente profundos e sérios, como não podia deixar de ser em se tratando de um filme de Lee.

Na verdade, Ang Lee extende simultaneamente o filme a extremos opostos. Ele é de uma seriedade inquietante e ao mesmo tempo de uma fantasia completa. Ang Lee não tem o menor constrangimento de mesclar ao tom psicológico e intimista do roteiro cenas fantásticas de superpoderes e situações clássicas praticamente xerocadas dos quadrinhos. Toda a intensidade da história é tão convincente que ninguém se sente menos envolvido quando a verossimilhança é esmagada pelo gigante esmeralda, seus saltos quilométricos, e sua calça que não rasga nunca. Essa dualidade se aplica igualmente ao próprio Hulk digital. Ele não parece computação gráfica. E também não parece real. Em cada cena que ele aparece, a única sensação que se tem, é de que ele é o Hulk. Mesmo. E está ali, fazendo aquilo tudo, interagindo com os tanques, helicopteros, soldados e desavisados das redondezas. Nada, nada neste filme destoa do contexto, nada quebra o conjunto. É um filme capaz de agradar aos fãs do Hulk, e capaz de agradar aos fãs de Ang Lee, mas que somente vai ter seu impacto total em quem for ao cinema para ver simplesmente o filme.

Resumo da ópera: Absolutamente diferente de qualquer adaptação de quadrinhos já feita, e absolutamente maravilhoso.



Wind

Nenhum comentário: