15.11.08

10 anos

Antes de começar, aviso logo que esse texto será longo. São, afinal, 3653 dias sendo avaliados. 10 anos, exatos, que cheguei ao Rio de Janeiro definitivamente. 522 semanas como morador da Cidade Maravilhosa. Algumas mais difíceis que as outras. Nesse meio tempo, morei em 7 lugares diferentes (6 apartamentos e uma casa). Alguns tetos, dividi com amigos. Outros, com companheiras. Uns poucos, habitei sozinho. E, recentemente, tive minha irmã morando comigo por alguns meses. Agora, ela mora na Tijuca, mas continua sendo a única família que eu tenho na cidade. E ela veio para cá ano passado!

Quando aportei por aqui, em 15 de novembro de 1998, eu era um moleque. Nem 18 anos completos, recém-formado no ensino médio. Vim para fazer vestibular de jornalismo, mas nem fazia idéia do que seria uma carreira de jornalista, escolhi no uni-duni-tê. Aos pais, disse que vinha pela faculdade. A mim mesmo, secretamente admitia que vinha para ficar junto da minha então namorada carioca, que havia conhecido no início do ano num evento em Brasília (!). Mas a verdade que eu mesmo não admitia era que eu vim porque precisava ser dono da minha vida. Precisava de uma independência e uma liberdade instantâneas, que só a distância pode trazer. Amo minha família, minha mãe e irmãs com quem eu morava, mas eu estava ansioso por vida. Por uma vida minha, pelas minhas regras, meus valores, meu tempo. Minha mãe ainda acha que saí de casa muito cedo. Eu acho que saí na hora certa. Acho que fui bem criado e bem preparado para encarar a vida, e por isso mesmo, não queria desperdiçar um só minuto, queria viver intensamente e sem rede de segurança. E não existe cidade mais intensa do que o Rio de Janeiro.

E a vida, como era de se esperar, me deu umas belas porradas. Me botou de joelhos em um par de ocasiões. Mas a dor virou experiência, e a experiência virou força para contraatacar. A vida também me deu alguns presentes inestimáveis, alguns que eu talvez nem merecesse. E, desses presentes, uns tantos tomou de volta sem pedir licença. A vida, mais vezes do que não, foi completamente nonsense. Eventualmente, foi brilhante em suas reviravoltas. E tudo isso, em retrospecto, era exatamente o que eu esperava da vida. Que ela não me poupasse, que viesse com tudo, desse o seu melhor. E eu dei o meu.

Nesses 10 anos de Rio, alguns ciclos inteiros se iniciaram e terminaram. Entrei e saí (jubilado) de um curso profissionalizante de piano. Entrei e abandonei um curso de informática na UFRJ. Fiz e completei um curso de Desenvolvimento e Design de Jogos 3D na PUC, uma vocação que eu jamais imaginaria um dia ver concretizada. E estou a apenas 1 ano de me formar, finalmente, no curso de Informática da UERJ, que - se a greve não atrapalhar - terei cumprido no tempo mínimo. Também nesse período de tempo, deixei de ser sustentado pela pensão do meu pai, tive meu primeiro emprego - que foi uma bosta -, passei num concurso e atingi a total independência financeira. Ou mudei de provedor, porque saem os pais, entram os bancos. Com o importante detalhe de que os bancos cobram juros.

Mas, se é fato inegável que eu sei muito mais da vida hoje em dia do que sabia há 10 anos, também é inegável que eu não sei grandes coisas. Até cheguei a ter algumas certezas, até bem fortes, que usei para me nortear. Mas percebi que poucas certezas sobrevivem ao tempo.

Uma delas, no entanto, ainda não caiu por terra. A certeza de que existem, sim, belezas eternamente cativantes. Fazem 10 anos que vejo o Pão de Açúcar quase que diariamente. Há pelo menos 3 trabalho ao lado de um janelão com vista para toda a Baía da Guanabara, e da minha janela de casa vejo Santa Teresa sumir por trás das nuvens em dias chuvosos e reaparecer com o sol. E mesmo dormindo e acordando com a cidade, eu sempre me sinto cativado por sua beleza. Nunca enjoei, e acho que jamais enjoarei. Meus períodos de mágoa com o Rio de Janeiro são todos causados por sua política, sua violência, ou pelas características por vezes escrotas de seus moradores. Mas nunca pela cidade. A cidade sempre faz questão de me lembrar por que eu a escolhi como cenário da minha vida adulta. Sempre resgata aquele sentimento de pertencer, mesmo que às vezes eu me sinta tão deslocado aqui. Já não acho mais que sair do Rio seria a morte, mas nunca vou deixar de sentir que, dentre todos os lugares em que morei - e olha que morei em vários - esse era o ideal para se viver os 10 anos mais difíceis e mais prazeirosos da minha vida.

E que fique bem claro que não escolhi o Rio apenas pelas belezas naturais. Foi aqui que fiz os melhores amigos que tenho, é aqui aonde as pessoas mais interessantes do país e do mundo sempre dão uma passadinha. Fiz tantos amigos especiais aqui, que resolvi dar uma festa para eles. Todos eles. Mesmo os que já perderam contato. E, para minha surpresa, a lista de convidados ficou bem grande! Só vem a provar que foram 10 anos muito bem vividos, e o mais importante, bem compartilhados. E a todos que compartilharam esses anos comigo - mesmo que por 24h apenas - ficam meu sincero abraço, meu agradecimento, minhas saudades. E meu convite para aparecerem aqui em casa e jogar conversa fora sempre que quiserem =)

Quando comecei a escrever esse post, achava que ele tomaria a forma de uma retrospectiva, um "compacto" da minha vida adulta. Mas grande parte do que me aconteceu já está de qualquer forma registrado aqui no Blog, seria um esforço inútil relembrar tudo outra vez - o choque de ser expulso de casa, o drama para entrar na faculdade, a descoberta do TDAH, o concurso, meu noivado de 5 anos do início ao término... tudo isso já foi abordado em profundidade antes, e pra ser bem sincero, não é nada disso que define minha história aqui. O que importa é o que restou, dentro de mim. É quem eu me tornei. As dificuldades de hoje serão superadas amanhã, as de amanhã no dia seguinte, e por aí vai. A vida não dá moleza. Mas a vida também nunca me fez estagnar. Estou em constante movimento, sempre melhor, sempre mais sábio. As coisas que perdi, guardarei para sempre comigo na lembrança. Mas as que ganhei, essas eu guardo ao meu redor, ao meu alcance, e é com elas que eu me fortaleço.

Enfim. É estranho reviver uma década. Na preparação para a festa, fiz uma seleção de fotos e músicas de cada era, para mostrar no telão. É, literalmente, ver a vida passar diante de meus olhos. Pela primeira vez, estavam lá, em ordem cronológica, todos os pontos decisivos da minha vida. E pareceu, ao mesmo tempo, uma eternidade e um dia. Estou muito diferente hoje. 10 anos que me amadureceram 25. Mas, por outro lado, parece que foi ontem que cheguei aqui trazendo apenas a fome de viver, e nenhuma certeza. Hoje, vendo como a história se desenrolou, admito que existem capítulos tristes, que talvez tivessem me demovido da idéia de abraçar o mundo caso eu soubesse que seriam escritos. Mas os grandes momentos, as passagens sublimes, vencem de lavada. Posso ser ousado e afirmar que fui feliz. Por que não?

Agora me resta descobrir o que os próximos 10 anos me reservam. E eu mal posso esperar ;)


Obrigado por tudo, gente.

Wind