4.1.03

Miha mãe sempre conta uma história de quando eu tinha uns 5, 6 anos de idade. Nós morávamos aqui no Rio, no saudoso apartamento da Tonelero (que ainda foi palco de tanta história em minha vida, inclusive recente, bem recente). Estávamos na mesa do café e ela puxou assunto comigo: "Rafa, lembra da nossa casa de Floripa?". Ela se referia à casa da General Bittencourt, onde eu morei nos anos mais antigos que minha memória ainda guarda, numa casa colada à dos meus avós, em Florianópolis, SC. Me mudar de lá havia sido difícil, e ao ouvir falar da casa, diz ela que eu abri um enorme sorriso e me interessei de imediato: "Lembro, mãe!". "Pois é" - disse ela - "A sala virou uma garagem". E, segundo minha mãe, o que se seguiu foi a cara de decepção e desencanto mais intensa que ela já viu. Também pudera, eu sempre lidei muito mal com a passagem do tempo e com as mudanças naturais. Pior ainda com as bruscas e inesperadas.

A verdade é que eu sempre tive dentro de mim um lugar onde as coisas nunca morriam de velhas. Nunca iam embora. Todas as lembranças gostosas da infâncias permaneciam sendo realidade ali, e eu frequentemente me refugiava nesse canto seguro, agradável, até mesmo essencial para o meu bem-estar. A casa de Floripa ainda existia dentro de mim, e eu ainda andava por seus cômodos, quando minha mãe displiscentemente estilhaçou aquilo tudo me dizendo que a casa não existia mais. É até meio inevitável que isso aconteça. Ninguém tem a obrigação de saber que meu equilíbrio tênue se embasa em coisas infantis e idiotas como essa.

Mas dói. Dói como ter seu mundo perfeito atravessado por um meteoro incandescente, incendiado e extinto em questão de segundos. Dói como o vazio que sobra logo após. Dói como a dor que sempre se adia até que o fato tardio venha confirmar o óbvio. Dói como uma faca gelada no coração durante o sono. Dói como perder a esperança. Dói.

Tomara, tomara que eu não precise passar por isso muitas vezes ao longo da vida.


Wind

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